Dependência Química
Dependência Química
Olá! Me chamo Fernanda dos Reis, sou psicóloga clínica (CRP 08/ 32070) e membro da equipe de profissionais do Psicolight, com cadastro específico (e-Psi) para realizar atendimentos de forma online. Utilizo como referencial teórico para meus atendimentos a psicologia analítica de Carl Gustav Jung e busco auxiliar as pessoas que atendo a se individuarem, ou seja, a se tornarem-se cada vez mais quem elas realmente são.
Hoje, irei apresentar brevemente a perspectiva da psicologia analítica sobre o tema da dependência química, como é realizado o tratamento e quais são os resultados apresentados com o mesmo. Espero que gostem!
DEPENDÊNCIA QUÍMICA
A Síndrome de Dependência (dependência química) é uma subdivisão do Transtorno mental e comportamental por uso de substância psicoativa e se caracteriza pelo "conjunto de fenômenos comportamentais, cognitivos e fisiológicos que se desenvolvem depois de repetido consumo de uma substância psicoativa (SPA), tipicamente associado ao desejo poderoso de tomar a droga, à dificuldade de controlar o consumo, à utilização persistente apesar de suas consequências nefastas, a uma maior prioridade dada ao uso da droga em detrimento de outras atividades e obrigações, a um aumento da tolerância à droga e por vezes, a um estado de abstinência física" (CID 10, 1996, p. 10).
A pessoa que sofre com a dependência química é, muitas vezes, chamada de “adicta”. O termo “adicção” possui sua etimologia no latim e significa "escravidão". O escravo é aquele que não tem direito de escolha e que só pode obedecer àquilo que lhe pedem. Ele possui devoção absoluta e é impotente perante o outro, assim como o adicto ou o “dependente” perante a droga ou a outro objeto de adicção. Na adicção, o indivíduo sempre desenvolve uma relação de dependência que precisa ser tratada de forma eficaz (BENZECRY, 2017).
A dependência de drogas interfere na consciência e em suas funções. O sujeito acaba por se alienar de si mesmo e por restringir sua personalidade e sua vida, tendo em vista que ele abdica de atividades, obrigações e valores em função da droga. Ao dominar a consciência do sujeito, a droga torna-se como se fosse o centro de sua consciência, fazendo o ego voltar-se em seu sentido (BENZECRY, 2017).
A psicologia analítica compreende que a pessoa com adicção é aquela que não aceita sua condição de ser humano. Isso porque o principal objetivo dessa pessoa é evitar o desconforto e controlar os sentimentos. Ao fazer isso, o adicto “nega seu medo de viver, de correr os riscos da vida, do desprazer, do não (...)” e da dor (BENZECRY, 2017, p. 40).
O foco da questão da dependência não está no uso da substância em si, mas na busca ávida por paliativos que aliviam as dores e desconfortos existenciais. A pessoa que faz uso de alguma substância psicoativa visa permanecer sentindo-se bem. O indivíduo aprende a encontrar um bem-estar vindo de fora e não desenvolve ou não utiliza seus recursos internos (ESCH, 1991 apud. BENZECRY, 2017).
O TRATAMENTO
“Uma verdadeira terapia analítica só é possível na presença de uma motivação pessoal e profunda”. No caso do tratamento da dependência química, isso acaba sendo visto como um empecilho, já que muitas vezes a motivação para análise não é psicológica e interior, mas exterior, vinda da sociedade. Dessa forma, o primeiro passo para que o tratamento ocorra é transformar a motivação em algo vindo de dentro para fora e não de fora para dentro (ZOJA, 1992, p. 15).
Para que isso ocorra, é imprescindível que a pessoa reconheça que sua vida é controlada - pela droga - e encontre um novo sentido para ela, desenvolvendo valores que sejam mais poderosos que a droga e que ela própria (tendo em vista que ela encontra-se identificada com a droga). A finalidade deste novo sentido é “ter a motivação necessária para o enfrentamento dos riscos e dores da vida, caso contrário, mesmo que fique ‘limpo’ ou sóbrio o adicto terá grande probabilidade de deslocar a sua dependência para outra substância ou comportamento” (BENZECRY, 2017, p. 41).
Para que o processo de recuperação aconteça, o adicto precisará reconhecer seus limites e encontrar um poder que considere superior a ele/droga para separá-lo dela. “Ele precisará se apoiar em alguma referência que não esteja ligada à droga, entretanto, como todas as referências mundanas estão, só lhe restará encontrá-la fora do mundo” (BENZECRY, 2017, p. 45).
"Mesmo que o adicto identifique essa referência em algo do mundo, como por exemplo, o próprio grupo, ele estará lhe atribuindo uma qualidade extramundana, transcendente, no caso, um poder superior ao da droga. Assim, ao se estabelecer uma referência extramundo, um valor transcendente, no processo de recuperação, a dimensão espiritual do homem será expandida" (BENZECRY, 2017, p. 45).
À medida que o adicto faz escolhas baseadas nas suas necessidades, ou seja, naquilo que lhe é, ou não, conveniente, ele abandona uma atitude voltada para a droga, ou seja, para seu interesse. É uma mudança em que o adicto para de ser guiado por seu interesse (droga) e passa a ser guiado por sua necessidade. Nessa mudança, ele acaba se separando da droga e, necessariamente, “se apoiando em alguma referência com aspecto sagrado, extramundano, transcendente” (BENZECRY, 2017, p. 47).
Nesse processo, o adicto é levado a descobrir e a renovar seus valores, reconquistando seu livre-arbítrio com a responsabilidade inerente a ele e a moralidade resultante. Assim, ele desenvolverá a autonomia que havia sido impossibilitada com a identificação com a droga (BENZECRY, 2017).
O processo de recuperação precisa incluir a vivência da adicção. Caso contrário, a droga permanecerá no inconsciente pessoal do sujeito. Assim, enquanto antes o indivíduo buscava a mudança a partir de fora (usando a droga), na recuperação, ele experimenta “a mudança possível, de dentro para fora, na qual a realidade não muda, quem muda é o olhar sobre ela, é o próprio indivíduo” (BENZECRY, 2017, p. 54).
RESULTADOS
A partir da intervenção da psicologia analítica, os sentimentos que, através da compulsão, eram evitados pelo adicto, passam a ser elaborados por um movimento reflexivo. Percebe-se que, mais do que evitados, estes sentimentos eram temporariamente modificados pelas drogas, enquanto o adicto ficava como se numa cápsula isolado de seu real sentimento atual. Com a intervenção, os sentimentos são considerados e valorizados, vistos como necessários ao processo de autoconhecimento e de transformação íntima (BENZECRY, 2017).
No processo de recuperação, o indivíduo encontra sentido para sua vida; ocorre uma progressiva transformação interior no sentido de uma ampliação da consciência, com exercício do livre-arbítrio e a progressiva expressão de sua singularidade, tal como o processo de individuação descrito por Jung ao tornar-se a si mesmo, o ser único e original que se é. Agora, o indivíduo é capaz de escolher, não é mais adicto, escravo da droga, tem a capacidade de dizer não (BENZECRY, 2017)
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Referências:
BENZECRY, Daniela. Drogadição, a Recuperação em A.A. e N.A. e a Espiritualidade – à luz da psicologia de C. G. Jung. Rio de Janeiro: Ed. Do Autor, 2017.
Organização Mundial da Saúde. Classificação Estatística Internacional de Doenças e Problemas Relacionados à Saúde: CID-10 Décima revisão. Trad. do Centro Colaborador da OMS para a Classificação de Doenças em Português. 3 ed. São Paulo: EDUSP; 1996.
ZOJA, Luigi. Nascer não basta. São Paulo: Axis Mundi, 1992.
